Resenha #35 — 'Livre para Voar'; Ziauddin Yousafzai

Livre para Voar Ziauddin Yousafzai
Título: Livre para Voar (Let Her Fly
Autor: Ziauddin Yousafzai 
Tradução: Denise Bottmann 
Páginas: 162 páginas
Editora: Companhia das Letras
Sinopse: Esta é a inspiradora jornada de um menino gago que cresceu em uma pequena vila no alto das montanhas do Paquistão e se tornou pai da mais jovem ganhadora do prêmio Nobel da paz e uma das mulheres mais influentes do planeta. Partindo de suas relações mais próximas — como filho de um pai tradicional; como pai de Malala e seus irmãos, criados e educados no Ocidente; como marido de uma esposa que está finalmente aprendendo a ler e a escrever; e como irmão de cinco mulheres ainda reféns do patriarcado —, Ziauddin Yousafzai conta sua história neste testemunho comovente sobre amor, paternidade e luta por direitos. 

  Quando recebi o exemplar de Livre para Voar, confesso que torci um pouco o nariz, pois a ideia de enaltecer um homem como responsável da jornada e grandiosidade de uma mulher, para mim, reforça um pouco o machismo que ainda vivemos nos dias de hoje. Porém, o que mais aprendemos é a não julgar um livro pela capa. Neste caso, a não julgar uma história pelo que se parece. E, pelo contexto que Malala esteve inserida desde o nascimento, vivendo no Paquistão, a figura de seu pai fora crucial para que ela tivesse consciência de que era livre – livre para lutar pelos próprios direitos, principalmente, pela educação de meninas e mulheres paquistanesas.

Livre para Voar Ziauddin Yousafzai

         Livre para Voar, com prefácio de Malala Yousafzai e contribuição da jornalista inglesa Louise Carpenter, fora lançado em fevereiro de 2019 pela editora Companhia das Letras e apresenta a trajetória de Ziauddin Yousafzai, pai de Malala, conhecia por sua luta pela educação de meninas e mulheres no Paquistão e fundadora do Fundo Malala. Uma das coisas que mais me chamou a atenção neste livro fora a frase na contracapa, onde Ziauddin diz “Sempre que alguém me pergunta como Malala chegou a ser o que é, costumo responder: ‘Pergunte-me não o que fiz, mas o que não fiz. Não cortei suas asas’”. O que gosto nessa frase é justamente a liberdade implícita que ela carrega; muitas de nós não alcançamos nossos objetivos por sermos impedidas de chegarmos até ele. E o motivo, muitas vezes, é por sermos mulheres.


         Como pai de uma menina engajada na própria educação, Ziuaddin nos apresenta seu contexto, sua criação e como chegara ao papel de pai apoiador de uma ativista. Uma das coisas mais importantes fora a sua visão, desde os primeiros anos de vida, do quanto o cotidiano paquistanês era injusto para com as mulheres. Tendo um irmão e cinco irmãs, sua família nunca prestara atenção nas habilidades, desejos e anseios de suas irmãs, preocupando-se com ele e com seu irmão – deveriam ter uma boa educação para que pudesse ascender na vida. Suas irmãs, todavia, deveriam esperar, casarem-se com homens influentes e dedicar suas vidas ao seu marido e filhos. Não havia nada de errado nisso, entretanto, Ziauddin acreditava que mereciam mais. Mereciam o direito de escolha.

        
         No Paquistão, as mulheres não devem ter seus rostos e nomes expostos. São conhecidas como “filhas de” e depois como “esposas de” ou “mães de”. Uma coisa tão simples para nós ocidentais, sermos conhecidas por nossos nomes, termos a chance de expor nossos rostos em redes sociais e nas ruas ser tão abominado e negado para outras mulheres. Ziauddin tem o cuidado de dizer o nome de todas as mulheres importantes em sua vida, como sua mãe, sua madrasta, irmãs, esposa e filha, sempre demonstrando sua importância e singularidade como pessoa, como mulher, como ser humano. Toor Pekai, sua esposa e mãe de Malala, é citada diversas vezes, principalmente por ter papel fundamental na criação de Malala e no desenvolvimento de Ziauddin como ser humano livre das amarras do machismo e patriarcado tão forte e cruel no Paquistão.

         Sempre que o velho Ziauddin aflorava em nosso casamento, era Toor Pekai quem o repelia. Por exemplo, no primeiro mês depois das bodas, enquanto ainda estávamos em Shangla, disse a ela que meu amigo vinha nos visitar. O pashtun* tradicional não costuma permitir que os amigos conheçam sua esposa. É algo raro de acontecer. Eu estava contente que Toor Pekai iria ver meu amigo. Ela o conhecia porque fazia parte da comunidade, mas não o encontrara como minha esposa. Quando lhe falei da visita, ela disse que ia se maquiar para se fazer apresentável. Reagi institivamente: “E por que você haveria de se arrumar para ele?”. Era o pashtun em mim.Mas ela me enfrentou e disse: “É meu direito usar maquiagem. E aqui é minha casa também. Se você não se sente à vontade como isso, então por que trazer seu amigo?”. Fiquei envergonhado. “Desculpe”, disse. “Você tem razão”.

         Ziauddin diz ainda que conheceu a palavra “feminista” no ocidente. E apresenta que tivera uma vida pensando nas injustiças vivenciadas pelas mulheres, mas nunca pensara nessa palavra. Logo, sempre fora feminista. Muitos homens ocidentais se deixam levar por ideais extremistas e por situações isoladas para criarem uma aversão pela palavra “feminista”. Entretanto, se você acredita que as mulheres têm o direito de ir e vir, de trabalhar, de estudar, de dizerem não, de viverem como bem quiserem, de permanecerem vivas após um término, de existirem por elas mesmas, então sim, você é feminista.
        
         A leitura de Livre para Voar se faz crucial, principalmente para homens, pais, filhos, esposos, namorados, amigos, a fim de que compreendam seus papéis em sociedade como podem contribuir para que as mulheres que amam possam viver com a liberdade que ainda lutam. Garantir que as mulheres recebam salários iguais, que possam caminhar sem medo de um estupro, almejarem (ou não) um casamento, desejarem (ou não) filhos, é um dever de todos.

         O caminho para os homens já veio feito e pavimentado. Ajudem-nos a construir o nosso, a fim de um mundo mais justo e igualitário, revendo os próprios conceitos, padrões e atitudes em sociedade.
E aí, já leu? Curtiu? Conta aí o que achou. :)

* Os Pashtuns (também chamados Pushtun, Pakhtun, Pashtoon ou Pathan) são um povo que fala a língua Pashto e que vivem primariamente na região que reside entre o Hindu Kush no nordeste do Afeganistão e na parte norte do Rio Indo no Paquistão. Fontei: Wikipedia

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