Título: Livre para Voar (Let Her Fly)
Autor: Ziauddin Yousafzai
Tradução: Denise Bottmann
Páginas: 162 páginas
Editora: Companhia das Letras
Sinopse: Esta é a inspiradora jornada de um menino gago que cresceu em uma pequena vila no alto das montanhas do Paquistão e se tornou pai da mais jovem ganhadora do prêmio Nobel da paz e uma das mulheres mais influentes do planeta. Partindo de suas relações mais próximas — como filho de um pai tradicional; como pai de Malala e seus irmãos, criados e educados no Ocidente; como marido de uma esposa que está finalmente aprendendo a ler e a escrever; e como irmão de cinco mulheres ainda reféns do patriarcado —, Ziauddin Yousafzai conta sua história neste testemunho comovente sobre amor, paternidade e luta por direitos.
Quando recebi o exemplar de Livre para Voar, confesso que torci um
pouco o nariz, pois a ideia de enaltecer um homem como responsável da jornada e
grandiosidade de uma mulher, para mim, reforça um pouco o machismo que ainda
vivemos nos dias de hoje. Porém, o que mais aprendemos é a não julgar um livro
pela capa. Neste caso, a não julgar uma história pelo que se parece. E, pelo
contexto que Malala esteve inserida desde o nascimento, vivendo no Paquistão, a
figura de seu pai fora crucial para que ela tivesse consciência de que era
livre – livre para lutar pelos próprios direitos, principalmente, pela educação
de meninas e mulheres paquistanesas.
Livre para Voar, com prefácio de Malala
Yousafzai e contribuição da jornalista inglesa Louise Carpenter, fora lançado
em fevereiro de 2019 pela editora Companhia das Letras e apresenta a trajetória
de Ziauddin Yousafzai, pai de Malala, conhecia por sua luta pela educação de
meninas e mulheres no Paquistão e fundadora do Fundo Malala. Uma das coisas que
mais me chamou a atenção neste livro fora a frase na contracapa, onde Ziauddin
diz “Sempre que alguém me pergunta como Malala chegou a ser o que é, costumo
responder: ‘Pergunte-me não o que fiz, mas o que não fiz. Não cortei suas asas’”.
O que gosto nessa frase é justamente a liberdade implícita que ela carrega;
muitas de nós não alcançamos nossos objetivos por sermos impedidas de chegarmos
até ele. E o motivo, muitas vezes, é por sermos mulheres.
Como pai de uma menina engajada na
própria educação, Ziuaddin nos apresenta seu contexto, sua criação e como
chegara ao papel de pai apoiador de uma ativista. Uma das coisas mais
importantes fora a sua visão, desde os primeiros anos de vida, do quanto o
cotidiano paquistanês era injusto para com as mulheres. Tendo um irmão e cinco
irmãs, sua família nunca prestara atenção nas habilidades, desejos e anseios de
suas irmãs, preocupando-se com ele e com seu irmão – deveriam ter uma boa
educação para que pudesse ascender na vida. Suas irmãs, todavia, deveriam
esperar, casarem-se com homens influentes e dedicar suas vidas ao seu marido e
filhos. Não havia nada de errado nisso, entretanto, Ziauddin acreditava que
mereciam mais. Mereciam o direito de escolha.
No Paquistão, as mulheres não devem ter
seus rostos e nomes expostos. São conhecidas como “filhas de” e depois como “esposas
de” ou “mães de”. Uma coisa tão simples para nós ocidentais, sermos conhecidas
por nossos nomes, termos a chance de expor nossos rostos em redes sociais e nas
ruas ser tão abominado e negado para outras mulheres. Ziauddin tem o cuidado de
dizer o nome de todas as mulheres importantes em sua vida, como sua mãe, sua
madrasta, irmãs, esposa e filha, sempre demonstrando sua importância e
singularidade como pessoa, como mulher, como ser humano. Toor Pekai, sua esposa
e mãe de Malala, é citada diversas vezes, principalmente por ter papel
fundamental na criação de Malala e no desenvolvimento de Ziauddin como ser
humano livre das amarras do machismo e patriarcado tão forte e cruel no
Paquistão.
Sempre que o velho Ziauddin aflorava em nosso casamento, era Toor Pekai quem o repelia. Por exemplo, no primeiro mês depois das bodas, enquanto ainda estávamos em Shangla, disse a ela que meu amigo vinha nos visitar. O pashtun* tradicional não costuma permitir que os amigos conheçam sua esposa. É algo raro de acontecer. Eu estava contente que Toor Pekai iria ver meu amigo. Ela o conhecia porque fazia parte da comunidade, mas não o encontrara como minha esposa. Quando lhe falei da visita, ela disse que ia se maquiar para se fazer apresentável. Reagi institivamente: “E por que você haveria de se arrumar para ele?”. Era o pashtun em mim.Mas ela me enfrentou e disse: “É meu direito usar maquiagem. E aqui é minha casa também. Se você não se sente à vontade como isso, então por que trazer seu amigo?”. Fiquei envergonhado. “Desculpe”, disse. “Você tem razão”.
Ziauddin diz ainda que conheceu a
palavra “feminista” no ocidente. E apresenta que tivera uma vida pensando nas
injustiças vivenciadas pelas mulheres, mas nunca pensara nessa palavra. Logo,
sempre fora feminista. Muitos homens ocidentais se deixam levar por ideais
extremistas e por situações isoladas para criarem uma aversão pela palavra “feminista”.
Entretanto, se você acredita que as mulheres têm o direito de ir e vir, de
trabalhar, de estudar, de dizerem não, de viverem como bem quiserem, de
permanecerem vivas após um término, de existirem por elas mesmas, então sim,
você é feminista.
A leitura de Livre para Voar se faz
crucial, principalmente para homens, pais, filhos, esposos, namorados, amigos,
a fim de que compreendam seus papéis em sociedade como podem contribuir para
que as mulheres que amam possam viver com a liberdade que ainda lutam. Garantir
que as mulheres recebam salários iguais, que possam caminhar sem medo de um
estupro, almejarem (ou não) um casamento, desejarem (ou não) filhos, é um dever
de todos.
O caminho para os homens já veio feito
e pavimentado. Ajudem-nos a construir o nosso, a fim de um mundo mais justo e
igualitário, revendo os próprios conceitos, padrões e atitudes em sociedade.
E aí, já leu? Curtiu? Conta aí o que achou. :)
*
Os Pashtuns (também chamados
Pushtun, Pakhtun, Pashtoon ou Pathan) são um povo que fala a língua Pashto e
que vivem primariamente na região que reside entre o Hindu Kush no nordeste do
Afeganistão e na parte norte do Rio Indo no Paquistão. Fontei: Wikipedia
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